Sábado,
31 de maio. Dia da partida. A tarde estávamos tranquilos pois, praticamente
tudo estava acertado, alguns detalhes como cunhos extras de amarração foram
instalados pelo Júnior como precaução, e foi só. Enquanto Fernando
preocupava-se com isso, Norberto e eu sentíamos o clima receptivo dos
associados da AVEN e sentamos numa mesa para ouvir um papo pra lá de animado e
muitas histórias náuticas interessantíssimas, como uma de um casal que com seu
pequeno catamarã de 28 pés desceu desde São Luís até a Bahia fundeando e conhecendo
cada abrigo da costa nordestina. Também ouvimos muitas histórias, algumas
hilariantes, de Sérgio e esposa, casal carismático responsável pelo estaleiro
Bate Vento, fábrica dos catamarãs que habitam os sonhos de muitos velejadores. Como
partiríamos num sábado muitos associados encontravam-se por lá, o clima portanto
era muito amistoso e empolgante, sentíamos a curiosidade da maioria com nossa
partida. Conversei ainda com um senhor chamado Jeferson, proprietário de um
trimarã feito artesanalmente por ele mesmo batizado de Fuga e fez questão de desvendar-me vários aspectos de seu barco,
inclusive o velame com a mestra içada através de uma espicha. Confidenciou-me também
que fez uma longa temporada no Caribe como capitão de um veleiro demonstrando-me
sua experiência e gosto por navegação.
Com
tudo pronto esperávamos pelo Capitão Glauco Vaz que acertava detalhes relativos
à sua partida e ausência por pelo menos um mês, tempo estimado do delivery até o destino do Guina. Chegou com sua esposa e
apresentou-lhe tripulantes e barco.
O Capitão
apresentara-se, então, psicologicamente, todos sabiam que o momento de zarpar
aproximara-se e pomo-nos todos na faina de desatracação. A euforia estava no ar
e todos almejavam adentrar no “marzão de Meu Deus”, nas palavras de Luiz
Henrique, o Saci. A expectativa e emoção tomaram conta da tripulação ao soltar
as amarras da AVEN. Dali em diante sabíamos, estávamos todos expostos ao mar,
não mais na segurança de um porto.
Nos afastamos da
AVEN e partimos em direção à barra da baía de São Marcos. As luzes das avenidas
e prédios de toda orla dos novos bairros de São Luís ainda davam aquela
impressão de acolhimento que estávamos sentindo. Aos poucos nos distanciamos da
capital e aqui e acolá passávamos por navios, vários, muitos, todos fundeados
esperando a hora de atracar no movimentado porto de Itaqui. Quando deixamos o
último navio pelo través de boreste sentimos internamente que a viagem
realmente começara. As luzes da cidade, que nos causam uma sensação de calor e
relativa segurança, ficavam para traz gradativamente.
Desabituados com a
rotina a bordo, banzeiro e ruído do motor, a ansiedade deu lugar ao cansaço e
nos pomos no cockpit a trocar algumas
palavras e descansar, alguns trouxeram até travesseiros. A apreensão deu lugar
ao sono coletivo, com exceção de Glauco que ficara no leme, de vigília, por
causa dos grandes bancos de areia que formam-se na entrada da barra.
Ultrapassados os
bancos, um a um, fazia seu turno. Essa seria nossa rotina daqui pra frente até
o próximo porto: Fortaleza. Embora pareça, não havia monotonia e divertíamos
contando causos e fazendo comida quando o mar permitia, quando não, atacávamos
no estoque de trubiscos que tínhamos escolhido no mercado. O comandante de um
turno exonerava-se quando chegava a hora, então colocava-se à disposição do
novo oferecendo algo para comer ou beber e ajudar a mantê-lo em vigília,
principalmente à noite, por pura cortesia e coleguismo, não estipulamos nada,
ocorreu naturalmente.
Assim sucedeu-se a
primeira noite a bordo em direção ao sul, durante quase toda a madrugada
perpassamos os Lençóis Maranhenses, lugar ímpar no mundo que Glauco, aumentando
nossa curiosidade, fez enaltecer explicando que a água de lá tem cor azul clara
e é doce. Nos sentimos quase na obrigação de voltar um dia para conhecer essa
preciosidade.
Acompanhe o desenrolar
dessa travessia nas próximas postagens.
Abraços, bons ventos
e até.
Maravilhoso relato, amigo ! Senti-me lá, navegando !
ResponderExcluirMaravilha! Se consegui levá-lo a bordo terei atingido meu objetivo. Grande abraço!
ExcluirEmocionantes relatos Rico! Realmemte nos sentimos tripulantes do Guina!
ResponderExcluirAbraços
Grandes Mauriane e Luiz, cidadãos do mundo, casal brasileiro nômade! Muito obrigado pelo elogio, fico lisonjeado se consegui embarcá-los, mesmo que pela imaginação.
ExcluirContinuem nos mandando notícias desse paraíso chamado Caribe que vocês estão tendo o privilégio de conhecer e morar.
Abraços desde a Babitonga!
Que delícia ler novamente essa sua postagem... me fez voltar naqueles dias.
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