sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Primeira velejada solo

O barco estava lá, na poita, pronto. Minha experiência ainda pífia, mas, a vontade, grande. Numa conversa entre nossa família e o Fabrício [Delphin 28 denominado Meraki], nosso vizinho de poita, tivemos a ideia de velejarmos os dois, em flotilha, cada um em seu barco.


Dias antes quando o Fabrício chegava de sua velejada solo.

Infelizmente o Fabrício, ocupado com sua mudança, não pode velejar nessa semana e não havia previsão para tal pois viajaria na outra. E aquela ideia ali, fervilhando. Se não agora, quando? Para tornar a primeira velejada solo uma realidade tive que ser honesto comigo mesmo. O plano era velejar pelo canal do Iriri até a entrada do Iate Clube do Capri e voltar até a poita. Uma meta realista, pequena, só pra poder sentir como é velejar por minha conta e risco, podendo cometer algum erro [como veremos adiante] sem nenhum prejuízo de qualquer natureza. Havia um risco, porém calculado.

         Luciane e Victor vieram comigo para prestar auxílio por terra, caso necessário.


Victor, sempre solícito, ajudou a colocar a bateira nágua

         Bateira nágua, como de praxe, chego remando até o Hoje! Lá, inicio um teste no motor que tem partida manual. Terceira tentativa e ele está funcionando. A maré vazava, ou seja, me levaria na direção pretendida, logo não precisaria “motorar” para sair, era só seguir. Seguindo os conselhos do Sr. Cesar, um dos velejadores mais experientes do Capri, usaria somente a buja. Içei-a e a deixei panejando ao vento, para que o barco ainda amarrado à poita, não fosse impulsionado. Nessa hora um dilema tomou conta de minha cabeça, ir ou não ir? Todo tipo de desculpa pairando, mas minha razão sempre contra-argumentava. Esse dilema estava quase se tornando uma novela e o final podia ser um recuo. Mais seguro assim, não? A cabeça fervilhando e eu não prestava mais atenção naquele diálogo, sim, pareciam duas vozes; eu estava dividido. Nessa hora, de uma forma um pouco provocativa e também quase hilária, começa a tocar na minha caixola “Bohemiam Rhapsody” do Queen. É isso mesmo, não me pergunte por quê. Enquanto não soltasse as amarras não sossegaria. Quando então o fiz, o refrão dizia: Oh mama mia, mama mia, Mama mia, let me go...” Soltei então, finalmente, as amarras dando risada, aquilo não poderia ser feito de outra forma, afinal de contas, não era uma parte do sonho se tornando realidade?

Pronto, estava velejando. A maré estava vazando e naturalmente me empurrando para fora do canal, além disso a vela buja também auxiliava potencializando essa força. A esteira do barco, que é o rastro que ele deixa nágua, era prova disso.



Saída pelo canal, maré vazante e buja aberta

Rapidamente me desloquei até a entrada do Iate Clube do Capri, lugar onde faria um jaibe para o retorno. Jaibe realizado com facilidade pois o vento era ameno, agora era voltar contra a corrente e amarrar o barco à poita. No meio daquela empolgação toda, a maré baixando repentinamente, lua cheia, maior amplitude de maré do ano, afrouxo na vigília das margens do canal e de repente, o encalhe! Ainda tentei escapar mas a natureza não perdoou. Quem sabe, se tivesse passado por ali trinta minutos antes nada ocorreria. Sr. Cesar também já tinha me contado de experiências com encalhes ali por perto e disse não haver problema algum, paciência, esperar a maré subir e ir embora! O problema é que havia encalhado na maré seca, 0.0 de acordo com a tábua das marés, pra que eu saísse dali com folga teria que esperar até o outro dia, 1.7 metros acima. Como não poderia atravessar o canal nadando, pois agora é inverno, pernoitaria no barco.

         Encalhei as 16 horas da terça, a maré cheia só aconteceria no outro dia naquele mesmo horário. Clima ameno, vestia bermuda, camiseta e tinha levado um moletom na mala, que fez toda a diferença no pernoite involuntário [como o colega Juca Andrade, uma vez citou em seu blog]. Estava descalço e a noite fez frio, algumas toalhas limpas e secas serviriam de cobertor. Sem comida, tinha uma garrafa de água mineral, o que foi suficiente. A noite começava a cair, então entrou pelo canal um pesqueiro de nome Vô Luiz. A Luciane, estava em terra e pediu auxílio para o Pepê, rapazinho que trabalha com Sr. Nestor. Ele conversou com o pessoal do pesqueiro que eram seus amigos. Então vejo o pesqueiro retornando e agora vindo em minha direção. Pessoal do Vô Luiz, um barco grande, estavam com um problema na caixa de câmbio e ficaram pela minha popa, à deriva, tentando engatar já com o cabo amarrado ao Hoje! Preocupados com o engate para seguirem avante se deixam levar pela maré, e, sem notar, acabam também indo para cima do baixio. Quando se deram conta era tarde, agora éramos dois. Eu não sabia onde enfiar a cara. Encalharam a uns 100 metros de mim, evitei conversar com eles com medo de ouvir um xingão. As quatro horas da manhã, a maré subiu um pouco, o necessário para o barco deles, sem quilha, flutuar novamente. Ligaram o motor e novamente batalhavam para poder engatar avante sem muito sucesso. Quando conseguiram, me explicaram que infelizmente não poderiam me ajudar, por motivo nítido. Entendi e agradeci. Ficaram de pedir ao pessoal do Clube que me auxiliassem.

O jeito era esperar. Minha espera não foi das piores. No meio da noite abria a gaiúta da cama de proa pra verificar se tudo corria bem e era agraciado com aquele céu limpo repleto de estrelas e uma lua cheia maravilhosa. Como bem disse a Letícia [nossa filha] para a Luciane:Você preocupada com o marujo e ele assistindo o luar de camarote! O fato do barco estar encalhado o deixava adernado e isso, causava um certo desconforto, mas tudo isso foi compensado pela experiência que tinha tido e a noite de luar que estava presenciando.

         De manhã, bem cedo, acordo com um barulho. Assustado, pulo do beliche de boreste e noto que eram, garrafa, copo e detergente líquido que haviam caído por conta da inclinação ainda maior do barco devido a maré seca.


A Luciane registrou o momento da maré seca

         Voltei a dormir, um pouco mais tarde, ouço o ronco de um motor de popa que aumentava. Encostaram no barco e me chamaram, era o pessoal do clube me perguntando se estava tudo bem e se eu queria retornar à terra. Aproveitei a carona, agradecemos, eu e a Luciane. O barco estava lá, havia jogado âncora [observe a foto], então decidi ir até em casa, tomar banho, comer algo e esperar até a maré encher. A tarde, a maré estava tão alta que o barco flutuava por cima do baixio. Pepê me auxiliou com a bateira do Fabrício, que é motorizada e levamos de volta o barquinho à poita. Barco amarrado à poita, agora respirava mais sossegado. Mais uma experiência no currículo náutico e bora aprender mais!

Agradeço as pessoas envolvidas que tornam nossas aventuras possíveis e seguras, a Luciane que sempre me apoia e agora está fazendo belas fotografias. Agradecimento especial ao Sr. Cesar que me encorajou e desmistifica, com seu conhecimento as coisas relacionadas a barcos e ao mar.


         Tenham todos bons ventos e ótimas velejadas, obrigado, e até a próxima!

domingo, 4 de agosto de 2013

Velejada Vespertina

Nessa sexta-feira, o dia inteiro de sol e quente para o inverno, chegando aos 25° C quando o astro rei estava à pino. Estava ansioso para poder fazer nosso veleirinho Hoje! deslizar novamente pelas águas da Babitonga e liguei na hora do almoço para o Marcelo, amigo que fizemos logo que chegamos com o barco, por terra, no Capri. Marcelo disse que estava terminando de almoçar e que logo partiria para o Capri.

Feliz proprietário de um Van de Stadt 30 Júpiter, nossa família teve o privilégio de estrear na Babitonga à convite dele no Talhamar. A euforia foi tanta que esqueci a máquina fotográfica no carro e não pude registrar visualmente essa velejada que pra nós foi histórica. Ficou o registro indelével na memória e o início de uma amizade, o outro amigo, Luciano Saraiva também estava nesse dia. Isso foi antes de acertarmos os detalhes para relançarmos o Hoje! nágua.

Horário acertado para a saída nos encontramos na frente da oficina do Sr. Nestor. Como sempre, o pessoal que trabalha com ele; Pepê, Patrick e Átila, sempre muito solícitos, nos auxiliaram com o bote [aqui chamam de bateira] que nos leva até o barco. Marcelo, velejador experiente [começou a velejar em 1978, eu nasci um ano depois!] começou a me mostrar como eu poderia arrumar as velas e tralhas para poder operar o Hoje! sozinho. Procedimentos todos efetuados, ligamos o motor e saímos. Como tínhamos o final de tarde somente pra velejar era melhor ligar o motor pra podermos sair pelo canal do Iriri, acelerando o processo. Usaríamos as velas na baía.


Saindo no motor para ganhar tempo e poder aproveitar a velejada antes do pôr do sol


Note, à direita da foto, a vela largada no convés, pronta para ser içada

Tão logo sentimos o motor ser desnecessário, e isso não demorou muito, pois soprava um nordeste típico de tempo estável por aqui nessa época, 6 nós, içamos as velas e desligamos o motor. Pronto, estávamos velejando! Ultrapassamos as bóias que delimitam o acesso ao Capri de forma ágil, os ventos eram brandos porém constantes e logo rajadas começariam a entrar. Os ventos eram gentis, mas o mar não estava liso, prenunciava na sexta o que alertaram os meteorologistas quanto a ressaca que ocorre hoje, domingo, e amanhã. A velejada foi das mais emocionantes, divertidas e também, pra mim, temerosas. Como nunca havia navegado com ondas, perguntava ao Marcelo se tudo corria normalmente, ele, sentindo as rajadas entrar, só “caçava os panos”, é meus amigos, ele tensionava mais as velas, o barco adernou [segundo ele] mais de 40° e as ondas, ah! as ondas... elas tinham quase um metro contando da sua base, e as vagas eram curtas. Subíamos e descíamos pelas ondas no contravento, segundo Marcelo, as rajadas chegaram a uns 16 nós, e ele só elogios ao barquinho. Devo concordar pois era nítido o cortar das ondas sem embarcar uma gota dágua. Nessa altura fiquei mais relaxado pois notava-se claramente que o trabalho não era dos mais penosos para o barco, pelo contrário, demonstrou valentia e ser feito justamente para isso. A emoção foi tamanha que não quis largar o leme para fotografar ou filmar, inclusive esse é a um dilema do fotógrafo/cinegrafista/jornalista, a partir do momento em que você participa do que está registrando você sai da posição de observador, ficando prejudicado o material. Essa vivência ficou registrada em minha mente e como o resultado foi positivo fico esperando uma próxima vez. Como não tínhamos muito tempo, era o final da tarde, demos um bordo até Itapoá, bem perto do farol [desativado], depois outro bordo até a torre do sumidouro e então, devido ao horário, achamos por bem retornar paralelamente à praia do Capri. Abrimos as velas de modo que o vento nos empurrasse, pela alheta, nos devolvendo até o canal do Iriri novamente. Radiantes e realizados, embora curta, a velejada foi um sucesso. Mais aprendizado pra mim e muita diversão para o Marcelo que ficou surpreso com as rajadas que recebemos de presente e feliz com a velocidade que desenvolvemos.


Retorno pelo canal do Iriri, que é bem abrigado e dificilmente tem ondulações.


Assista ao vídeo da velejada:



Mais uma velejada vitoriosa por aqui, agradeço ao Marcelo por compartilhar de sua experiência comigo.


Abraço grave, ótimos ventos e velejadas a todos! Ótima semana e até a próxima!