domingo, 5 de janeiro de 2014

Água!

É incrível nossa capacidade de adaptação, e ao contrário do que se pensa, na prática, uma mudança de postura e comportamento em relação ao uso (e abuso) de todo material industrializado para embalar (por exemplo) água é facilmente substituído por outra forma de conduta, mais consciente, sistêmica e ecológica.



Esse ano, depois de algumas conversas, eu e Luciane decidimos implantar uma medida simplíssima para minimizar o impacto ambiental causado pelo uso desenfreado, e por que não, estúpido e inconsequente, de garrafas plásticas. Oferecíamos na Pousada, assim como a quase totalidade de pousadas e hotéis, o frigobar abastecido de toda sorte de bebidas. Pensávamos na “comodidade” do hóspede. Ao final das temporadas se revelava o engano. Um monte de bebidas sobravam e a maioria delas não queríamos consumir. Resultado: desperdício! Esse ano utilizamos uma tática bem diferente e já notamos resultados bem satisfatórios, o primeiro dos quais, o sorriso na face dos hóspedes. Resolvemos adotar jarras plásticas permanentes para água filtrada. A água, agora filtrada, é entregue aos hóspedes como cortesia, assim como na casa da nossa avó. Não oferecemos mais água mineral plastificada. Até por que o lucro da venda dessas águas era irrisório e o trabalho pra controlar a entrada e saída não se justificava também. Ademais, a parte primordial é o fato de usar garrafas plásticas para consumir um bem natural tão (ainda) abundante. Outra medida foi abolir o uso de manteiga em blister, que resultava numa grande quantidade de lixo plástico completamente desnecessário. Alternativamente adotamos a manteiga em lata, prontamente aprovada pelos hóspedes. Não se justifica usar plástico como embalagem descartável, além do mais, a maioria das vezes, tudo vira lixo e de alguma maneira acaba sendo carregado por rios, e esses desembocam no mar. Quem ainda não sabe o tamanho desse problema no Pacífico deve assistir o filme Planeta Água. Outro documentário que age como um tapa em nossa consciência é o longa Oceans. Dessa forma nós “juntamos os pontos” e conseguimos enxergar a grande realidade: Estamos todos conectados, ninguém faz algo sem impactar outrem, homem, fauna ou flora.





Alguma coisa aconteceu em nosso projeto, quem sabe a revolução industrial, que nos fez tomar um caminho equivocado. Precisamos reconectarmos à natureza urgentemente, pois essa conexão foi desfeita. Basta observarmos mais atentamente nossos hábitos e costumes na maioria das vezes também evitáveis. Posso lhe afirmar que a mudança de postura e compromisso diante do respeito que devemos ter pelo que é natural só nos traz alento e tranquilidade, nos sentimos mais leves. Agir sem nos questionar é um equívoco, já dizia um dos pensadores mais cabeçudos que tivemos sobre solo terrestre, o grande mestre Sócrates: “Uma vida sem exame não vale a pena ser vivida”.

Com o advento incompreensível da debandada dos citadinos para as praias nas vésperas da virada do ano, é perfeitamente compreensível a falta de água e luz, visto que os balneários não foram concebidos para a quantidade absurda de pessoas que invadem as areias das praias causando tumulto e inevitavelmente sujando todo lugar por onde passam. As vezes, acredito, os animais não sentem inveja de nossas atitudes, lá no fundo de sua consciência pura, devem sentir pena. E não pense que a população litorânea fica muito contente com esse contingente todo. É só imaginar sua casa com quatro vezes a capacidade, em poucas horas tudo deixa de ser festa e passa a virar caos.

Precisamos fazer uma auto análise coletiva afim de descobrirmos hábitos arraigados, arcaicos e, consequentemente, incabíveis em pleno século XXI. É preciso mais respeito com as pessoas que residem no litoral, os legítimos caiçaras. Há também aqueles que resolveram, na contra mão da falsa ideia de conforto que as grandes cidades oferecem, adotar esse estilo de vida simples, por vocação e paixão pelas coisas do mar. Nessa hora, em que, não se sabe por qual razão, esse contingente afoito desce pelas estradas das serras do mar causando um gargalo efêmero e desnecessário, em busca de um momento fugaz. Querem todos “estourar” uma Cidra Cereser na areia da praia. Querem todos se embebedar em busca de um micro momento. E isso parece unânime. E como nosso popular dramaturgo Nelson Rodrigues uma vez intuiu: “Toda unanimidade é tola.” O grande problema desse momento fugaz é, que para se poder vivenciá-lo, nós como seres humanos e “inviáveis”, como Millor Fernandes, com sua visão de coruja, uma vez nos enxergou, consumiremos muitos recursos naturais, a começar pelos mais básicos; água e energia elétrica [essa desconhecida dos antigos, e, portanto, eventualmente dispensável]. Inclusive, no meio dessa confusão toda, algumas poucas residências incendiaram, muito provavelmente pela fiação elétrica comprometida pela corrosão e falta de uso.

Os instrumentos midiáticos, com suas táticas manipulatórias, nos fazem crer que suas falsas demandas são coletivas, reais e naturais. As técnicas são tão precisas que acabamos por aceitar sem muito questionamento algo inicialmente inadmissível, completamente artificial e fabricado. No entanto, conversando com nossos semelhantes, muitas vezes conterrâneos, nos surpreendemos com um discurso familiar, de mesma gênese, dito com outras palavras, comprovando que nossas demandas são idênticas, muito diferentes daquelas apregoadas pela propaganda.

A questão da água é simplesmente primordial, o recurso natural mais importante que temos. Ela sempre deve estar no centro de nosso debate. O senso crítico obrigatoriamente precisa ser exercitado e não podemos postergar ou delegar essa questão a terceiros. É um patrimônio muito valioso para ser entregue nas mãos de outrem. É uma responsabilidade coletiva e ao mesmo tempo individual. Toda a vida e manutenção dela passa pelo uso, consciente ou não, da água. Tudo que fazemos, e façamos uma análise diária, está intimamente ligado ao uso dessa preciosidade, obviamente vital. A simples falta dela nos transforma em seres incompletos, a qualidade de vida decresce absurdamente à medida que a qualidade da água potável decresce.

O tema é muito extenso e, quiçá, inesgotável. O que importa é que aos poucos vamos fazendo nossa parte mudando alguns hábitos depreciativos e desrespeitosos. É necessário pensar por si só, pois nosso comportamento coletivo está resultando em mazelas sociais gravíssimas, e tudo isso é evitável, basta usarmos nossa enorme capacidade cognitiva, proporcionalmente exagerada em relação aos outros seres vivos.


É com essa análise que convido você a começar esse novo ano de 2014 com o pé direito, mudando pequenos aspectos do cotidiano. Estando bem com nosso meio, estamos bem conosco. São os votos da nossa família à sua. Feliz Ano Novo!


4 comentários:

  1. Florianis, que belo exemplo, seus hospedes devem ficar satisfeitos e orgulhosos de serem seus clientes, outro grande problema que causa o consumo excessivo e por contrapartida o enriquecimento das grandes empresas é a obsolescência programada, tudo hoje é feito para durar pouco forçando o consumo cego e hipnótico, somos zumbis manipulados pelas grandes empresas, pequenas atitudes como a da sua pousada, são louváveis e juntando muitas pequenas atitudes como essa teremos uma sociedade mais saudável e menos poluidora! Parabéns amigos, fico orgulhoso de conhecer (mesmo que só virtualmente) gente como vocês!

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  2. Os hóspedes acham muito interessante Walnei, primeiro não precisam pagar pela água, depois, acredito, devem pensar a respeito, e é aí que a coisa começa a ficar boa.

    Não é possível ficar passível diante de atitudes simples que devemos adotar. A experiência de velejar também nos abre uma brecha na consciência no sentido de economizar água, pois sabemos que a água potável num barco é escassa e finita. Barco a vela tem tudo a ver com um estilo de vida saudável e sustentável! Concordo, o sistema nos faz querer coisas desnecessárias, como se isso não fosse absurdo, ainda querem vendê-las em grande quantidade.

    Obrigado pelos elogios e comentário, ficamos felizes pelas palavras.

    Grande abraço desde a ilha encantada!

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  3. Rico, mudar o mundo sem ser ecochato, xiita e pentelho é um grande desafio. Parabéns! Essa rvolução começa na nossa casa, é feita aos poucos e os resultados não colheremos. Mas é assim que se faz! Velejar é ecologicamente correto desde sempre! Bons ventos!!!

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  4. Muito obrigado Cmte. Juca! Com toda certeza, estamos tentando "arrumar a casa" para os filhos e netos. Obrigado pela presença e comentário. Bons ventos e abraços desde a Babitonga!

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